Em 2023, 96 árvores de risco foram removidas na cidade; em 2022, foram 187

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Nos últimos meses, a reforma de praças e os temporais que atingiram o município remetem a um elemento comum: as árvores na área urbana. Afinal, elas são lembradas apenas quando é preciso retirá-las de um ponto para revitalizar um espaço público ou quando tombam e provocam transtornos. De janeiro até o final de outubro deste ano, 96 árvores de risco passaram por alguma intervenção (poda e corte) ou acabaram tombando em Santa Maria. A maior parte estava localizada no Centro. Já em 2022, durante todo o ano, 187 árvores consideradas de risco foram acompanhadas pela Defesa Civil em ações de poda, corte ou queda, sendo a maioria das unidades do Bairro Camobi.

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De acordo com o superintendente da Defesa Civil municipal, Adão Lemos, esses casos chegam até a equipe por meio de encaminhamentos da Secretaria de Meio Ambiente ou pelos pedidos enviados pela comunidade. A pasta também já conhece e monitora algumas árvores de risco, agindo, em determinadas situações, por iniciativa própria ou com auxílio do Corpo de Bombeiros. O importante, conforme Lemos, é atuar preventivamente. Por isso, é preciso conhecer os principais fatores que fazem com que a vegetação apresente riscos de queda:

– Um dos fatores é o grande porte dessas árvores, que comprometem o espaço urbano. O segundo fator é que são árvores muito velhas e com parasitas, que estão doentes. Também temos árvores que estão no corredor dos ventos, em locais com grandes rajadas que vêm da Região Oeste, vão em direção ao Centro e, depois, sobem em direção a Itaara. Árvores também caem por causa do solo encharcado diante do excesso de chuvas – explica Lemos.

Em 2022, 75 árvores tombaram em um único dia de fevereiro, quando Santa Maria registrou ventos de 118 km/h. Até o momento, esse é o recorde de queda de vegetação diária na cidade. Neste ano, o maior registro foi no mês de setembro, quando cinco árvores caíram, mas em decorrência das chuvas.

– O maior risco, realmente, são as rajadas de vento. No mês passado, em 12 de setembro, cinco árvores caíram. Não teve rajadas de vento, mas o índice pluviométrico foi muito alto – 189,6 mm em duas horas. Naquele mês, choveu 632,8 mm, o maior índice do histórico nos últimos 110 anos. Aqui, entra a questão do solo encharcado, que também é um dos principais motivos para as árvores caírem – complementa.

Os problemas se agravam porque, até hoje, não há um levantamento, por exemplo, sobre quantas e quais espécies de árvores existem na cidade. Esse inventário é apenas um dos elementos base para a construção de um plano de arborização, que também pode indicar as práticas de manejo necessárias para o município e como a vegetação pode conviver com outros elementos que formam o espaço urbano.

​​Queda, poda e supressão de árvores de risco em Santa Maria*

2022

  • 187 árvores (queda de 105 em temporais)
  • Principais bairros das intervenções _ Camobi, Nossa Senhora Medianeira, Nova Santa Marta, Bonfim, Chácara das Flores, João Goulart, Urlândia, Salgado Filho e Pinheiro Machado

2023

  • 96 árvores (queda de seis em temporais)
  • Principais bairros das intervenções _ Centro, Camobi, Passo d'Areia, Perpétuo Socorro, Nossa Senhora de Lourdes, Km 3, Nova Santa Marta, Lorenzi e Juscelino Kubitschek
Foto: Nathália Schneider (Diário)

Plano de arborização

Há pelo menos 15 anos, são feitas tentativas para criar e implementar um plano de arborização em Santa Maria. Em 2011, o documento, inclusive, já chegou a ser aprovado em algumas instâncias, mas nunca colocado em prática. Cada tentativa foi apresentada, analisada e debatida pelo Diário.

O plano segue sem datas para efetivação. A única perspectiva anunciada é para o final do primeiro semestre de 2024, com a definição dos tipos de estudo a serem realizados para embasar o documento.

Mais recentemente, na gestão atual da prefeitura, em 2018, uma equipe começou a ser organizada para conduzir o censo das árvores do município. Porém, com o início da pandemia, o trabalho não teve continuidade.

Até o início deste ano, o plano de arborização estava sob responsabilidade da Secretaria de Meio Ambiente. De acordo com a prefeitura, diante da necessidade em integrar outras demandas neste debate, o Instituto de Planejamento (Iplan) assumiu a pauta. Por enquanto, estão sendo avaliados como serão feitos os diagnósticos que vão auxiliar na revisão do Plano Diretor. Dentre eles, estão aqueles que abrangem a arborização.

Paralelamente, a prefeitura manifestou interesse em dar continuidade a uma parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) para realização do censo arbóreo. Até o momento, não há previsão de quando essas iniciativas devem sair do papel.

A parceria com a UFSM começou em 2019, com a elaboração de um projeto piloto chamado “Santa Maria Mais Verde”, para a realização de um diagnóstico da arborização e das áreas de preservação permanente da cidade.

O documento foi aprovado pelo Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Condema), mas esbarrou, primeiro, na pandemia e, depois, em questões financeiras e jurídicas. O projeto estava orçado em R$ 242 mil, e a origem dos recursos seria o Fundo Municipal do Meio Ambiente.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Nesse período, o plano de arborização foi repassado para o Iplan. Apesar disso, a prefeitura, por meio da Superintendência de Licenciamento e de Controle Ambiental, informou no processo, em setembro deste ano, que ainda tem interesse em prosseguir com o projeto piloto em parceria com a UFSM, já que, segundo consta na ação, “não houve andamento do processo conduzido pelo Iplan”.

De acordo com o presidente do Iplan, Ewerton Falk, o instituto assumiu a responsabilidade do plano de arborização em função da temática ambiental influenciar e também sofrer interferência de outras questões, como saneamento (redes de esgoto e água), energia elétricamobilidade urbana e segurança, por exemplo. Por isso, foi incorporado no conjunto de estudos que vão ser realizados em Santa Maria para revisão do Plano Diretor.

– Entendemos que, ao longo dos anos, vem se discutindo planos isolados que têm impacto na causa maior, que é o Plano Diretor. Assim, temos que ter um conjunto de estudos que transitam por várias secretarias. O plano de arborização é um deles. Tem um investimento alto, mas acreditamos que sem esse conjunto de estudos entregues, o Plano Diretor se torna frágil – afirma Falk.

A realização desses diagnósticos será feita posteriormente, ainda sem data estipulada.

– Como existe a questão do investimento, de fato, precisamos traçar um planejamento e uma linha de tempo para que isso aconteça. O papel do Iplan em relação ao plano de arborização é esse, dar um direcionamento para Secretaria de Meio Ambiente e para as demais do que precisa ser feito para que seja construído um plano adequado a todas as demandas da cidade – diz Jessica Corsini Vieira, vice-presidente do Iplan.

Sobre o censo arbóreo que está em debate também pela Superintendência de Licenciamento e Controle Ambiental, Falk salienta que não será gasto dinheiro público em mais de um momento para o mesmo objetivo:

– O censo, com certeza, será necessário para a conclusão do plano. Se fizerem o censo antes da conclusão do nosso trabalho, obviamente, vamos usar esse conteúdo para diminuir o custo orçamentário desse conjunto de estudos. Caso contrário, se eles não conseguirem fazer antes de nós, obviamente, vamos ceder esse conteúdo. Até porque, a prefeitura é um ente só, mas não abdicamos das expertises individuais. O censo arbóreo e o manejo de árvores é cotidiano, isso é (com a secretaria de) Meio Ambiente. O plano maior que está como nossa responsabilidade é entregar trabalho para a secretaria – detalha Falk.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Na Justiça

O caso também é acompanhado pelo Ministério Público por meio de uma ação civil pública. O processo existe desde 2013 e o objetivo inicial não era o plano de arborização, mas investigar a forma como estavam sendo conduzidas, pela prefeitura, as autorizações para supressão de árvores. A cobrança em torno do avanço do plano foi incorporada na ação posteriormente. Na época, uma investigação apontou que estas práticas eram feitas de forma indiscriminada, com o consentimento do município.

Essa questão foi considerada resolvida em 2021, quando o município lançou um sistema que informa a tramitação dos licenciamentos para poda e supressão de árvores. Ao longo deste período, porém, foi observado a necessidade de incluir na ação mais aspectos sobre arborização, dentre eles, a elaboração do plano e do censo arbóreo:

– A ação judicial tem o tempo dela. Tem ações rápidas e outras lentas. Há uma situação excepcional em relação a isso porque o objeto inicial não era o plano de arborização. O objeto era melhorar o licenciamento e a autorização ambiental para poda de árvores. Isso foi obtido em 2021. Conseguimos transformar essa ação também para um plano de arborização e acho que essa parte precisa caminhar melhor. Temos feito reuniões frequentes com o município justamente nesse sentido. O tempo corre contra o meio ambiente e contra esse projeto. Precisamos ter, o quanto antes, uma definição. Temos que ultrapassar essa barreira que é a última etapa, digamos assim, para o andamento do processo _ explica Diego Corrêa de Barros, 2º Promotor de Justiça da Promotoria de Justiça Especializada de Santa Maria.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

O Plano Municipal de Arborização precisa seguir algumas etapas para ser aprovado e efetivado:

  • Diagnóstico – Esse é o primeiro passo para que o plano seja elaborado conforme as características do município. Em Santa Maria, várias ações e projetos foram iniciados, mas nenhum concluído
  • Mapeamento das árvores – Nessa etapa, por meio de georreferenciamento, é feito o cadastro das árvores da área urbana, com indicações sobre a localização dos troncos, distância do meio-fio, distância da edificação e recuo predial, distância de cruzamentos, distância entre árvores, entre outros pontos
  • Mapeamento do entorno – Após ter as árvores cadastradas, é preciso verificar o que há ao redor dessa árvore para identificar possíveis riscos. Nessa etapa, estão mapa do solo, cadastro da rede de água, dados da rede de distribuição de energia, cadastro da rede coletora de esgoto, dados da pavimentação urbana, entre outros
  • Análise de risco – Feitos os dois mapeamentos, essa etapa busca analisar as árvores que oferecem algum tipo de risco. É verificado, também, se a espécie é nativa ou invasora, se é suscetível a pragas, se suas características são adequadas ao local. Esse passo serve como base para a definição de manejos
  • Elaboração do plano – Depois que todas as etapas anteriores forem executadas é que se começa a pensar no Plano de Arborização Urbana. Para isso, determinadas normas precisam ser obedecidas, a fim de garantir que os valores culturais, ambientais e a memória da cidade sejam respeitados, de forma a contribuir para a biodiversidade do local. É nessa etapa que são definidas quais árvores serão plantadas, quais critérios para escolha dos locais, como serão produzidas ou adquiridas as mudas, como será a manutenção dessas espécies (poda, manejo etc), entre outros aspectos

Manejo

Atualmente, o manejo de árvores em Santa Maria é feito pela Secretaria do Meio Ambiente. O secretário adjunto, Luiz Felipe Weber, indica que cerca de 500 árvores recebem manutenção em várias regiões da cidade. 

supressão possui procedimentos diferentes para espaços públicos e privados. Por mês, são realizadas entre 15 a 20 solicitações para retirada/corte de árvores que afetam passeio público, muros e rede elétrica.

O secretário adjunto alerta que ainda é recorrente práticas ilegais de manejo, e de depredação da arborização:

– Infelizmente, temos diversos casos que chegam por meio de denúncias de supressões indevidas, podas não autorizadas ou drásticas. Acabamos sofrendo bastante também com casos de depredação, quebram mudas, então, temos que ter o cuidado de substituir e repor – lamenta.

Na cidade, também existem árvores que estão protegidas por lei e são consideradas tombadas, ou seja, não podem ser suprimidas.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Com relação ao plano de arborização, Weber reforça que seria uma ferramenta importante para o trabalho da superintendência. Hoje, como não há um censo, não é possível estimar qual o impacto das supressões, por exemplo, para o meio ambiente de Santa Maria.

– O plano seria um excelente artifício para podermos trabalhar e dar agilidade a superintendência na medida em que iríamos ter o levantamento de todos os exemplares de arborização públicos, teríamos previsto quais são exemplares, em que tamanho, em quais locais, quais distanciamentos, porque em determinadas localidades precisa ser feito um recuo ou plantio. Isso nos dá uma cartilha para seguir e acabaria nos facilitando bastante a vida – declara o secretário adjunto.

Árvores retiradas de espaços públicos em reforma

Praça Dr. Astrogildo de Azevedo (obra concluída)

  • 20 árvores retiradas
  • Plantio de 14 nativas das espécies caroba, ipê-roxo, jerivá e sibipiruna

Calçadão Salvador Isaia (obra concluída)

  • Não houve supressão
  • Plantio de 11 jerivás, três extremosas e três quaresmeiras
  • Três palmeiras areca bambu transplantadas para o canteiro central da Avenida Rio Branco

Praça Saldanha Marinho (obra em andamento)

  • Quatro árvores exóticas retiradas
  • Três jerivás adultos transplantados para Praça do Novo Horizonte e quatro jerivás jovens para a rótula da Avenida Fernando Ferrari
  • Cinco palmeiras fênix realocadas
  • Ipês-roxo ainda devem ser plantados na praça

Defesa Civil quer avaliar saúde das árvores

Com o objetivo de melhorar o monitoramento e assegurar as licenças para retirada de árvores de risco, a Defesa Civil está buscando recursos para comprar um penetrógrafo que custa em torno de R$ 140 mil. O equipamento possibilita verificar o estado detalhado de saúde da vegetação.

– Esse equipamento registra a resistência oferecida pela madeira do tronco. Na extremidade, existe uma agulha de aço, revestida em teflon, que penetra no lenho sem causar danos. Em conjunto com a avaliação visual, a análise dos parâmetros do penetrógrafo permite ao profissional diagnosticar a saúde da árvore no seu interior, verificando presença de ocos, cavidades internas, rachaduras, madeira em decomposição e condições fitossanitárias, prevendo a necessidade de supressão de espécimes arbóreos que causam perigo – comenta Lemos.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

O que dizem os especialistas

Por que é importante uma cidade ser devidamente arborizada?

"Uma arborização urbana devidamente implementada e manejada vai contribuir com a amenização da temperatura, com o conforto térmico para a população e com a beleza cênica. Há estudos que demonstram que as populações que têm acesso a parques e praças nos seus bairros têm uma redução em problemas cardíacos porque estes locais levam a população a se exercitar. Além disso, contribui para a manutenção de um contínuo ecológico entre o meio urbano, periurbano e rural, criando corredores de passagem da fauna. A arborização ainda pode reduzir a poluição atmosférica, sonora e visual, e o impacto da energia cinética de chuva no solo" 

Ana Paula Rovedder, engenheira florestal

"O que torna uma cidade bela, bonita, atrativa, muitas vezes, é a arborização urbana, é o cultivo de árvores em praças e em ruas. As árvores também proporcionam sombra e um bom local de lazer, no caso de praças ou parques próximos a centros urbanos. É fundamental que uma cidade tenha o elemento arbóreo como componente da sua paisagem porque a cidade representa um lugar muito antropizado"

Luciano Denardi, engenheiro florestal

Quais os problemas que mais impactam no manejo das árvores e que podem ser observados em Santa Maria?

"Os principais problemas são falta de entendimento, de conhecimento, de informação e de monitoramento contínuo do que tem na cidade e da situação da qualidade da saúde da árvore, o que chamamos de fitossanidade dos indivíduos arbóreos. As prefeituras precisam ter domínio de informação e, isso, conseguimos por meio do inventário da arborização urbana. Com isso, a prefeitura consegue, por exemplo, saber onde há indivíduos com risco de tombamento, que pode levar a algum tipo de sinistro.

Em termos técnicos mais práticos, temos a poda drástica, que é a supressão da copa inteira da árvore. Os ramos ficam mais suscetíveis à queda, reduzindo a beleza e o ciclo de vida da árvore e a sua própria arquitetura de copa. A poda drástica é recorrente no meio urbano e é um problema. Outro problema também pode ser o vandalismo, que são as pessoas que interferem na arborização, sem autorização, suprimindo galhos, ou cortando de forma que não pode"

Foto: Nathália Schneider (Diário)

"O principal erro é feito no plantio de árvores em ruas, avenidas e praças. É (preciso) estudar antes para ver o porte que essa planta pode atingir quando adulta. Árvores de grande porte, obviamente, crescem bastante em altura, formam copas bem amplas e isso pode, em certos locais, causar vários problemas. 

Em dias de tormenta, por exemplo, vemos o tombamento de árvores ou a queda de ramos sobre a fiação elétrica. Isso realmente é um perigo, é muito grave. Para árvores que já estão nessa condição é aconselhável fazer podas, mas (sem fazer uma) poda drástica porque assim a planta perde toda a beleza. Outro problema é a questão das raízes. Muitas plantas de grande porte, naturalmente, vão formar raízes também de grande porte, que acabam afetando as calçadas, destruindo parte do calçamento"

Luciano Denardi, engenheiro florestal

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